quarta-feira, junho 28, 2006

Uma Amizade...

Pois é, hoje estou eu aqui a passear pelo Gerês, e lembro-me de quando a conheci no mesmo sítio onde estou, neste preciso momento. Eu era uma simples criança pobre naqueles anos após o 25 de Abril e tinha que fazer de tudo para ajudar os meus pais a ganhar dinheiro. Ela era uma rapariga linda, rica, de olhos azuis, uns olhos que me fascinavam porque quando olhava para eles, parecia que estava a avistar o mar.
Certo dia, estava eu a cortar uma árvore, quando ela apareceu do nada. Eu estava a pôr as madeiras que tinha cortado no saco que estava do outro lado da estrada quando, de repente, uma grande carro...um "Rolls - Royce", me apareceu à frente. Eu não tomei sentido da situação mas consegui perceber que tinha sido atropelado.
Passadas várias horas, acordei num quarto lindo. Olhava para o tecto e só via pinturas barrocas, olhava para os lados e via tudo em ouro, portas banhadas a ouro, janelas... e lembro-me, também, de ver uma grande secretária, que naquela altura se usava muito, e eu não me lembrava do nome da mesma... Ah! Já me lembro. Secretária estilo Luís XIV.
Senti um ruído na porta e nesse preciso momento entrou a rapariga que eu tinha visto na Serra.
- Olá! Eu chamo-me Mariana. Já estás melhor? - disse ela.
Quando ela disse aquelas palavras, senti uma forte amizade a construír-se dentro de mim.
- Olá... Eu sou o João. Sim já estou melhor, mas o que é que me aconteceu?
- O meu condutor, sem querer, distraíu-se ao falar comigo, e quando ohou para a frente já não havia nada a fazer.
Depois de vários horas de conversa, eu já tratava a rapariga por Mariana e ela já me tratava por João. Foi amizade à primeira vista. Mas durante esta conversa, esquecera-me de algo muito importante. Os meus pais!.
Mariana rapidamente me levou até eles, e chegado a casa, deparei-me com uma cena triste. Os meus pais tinham estado a chorar a tarde inteira e percebi que, de certeza, tinham andado à minha procura. Quando me viram abraçaram-me fortemente, e, pouco tempo depois, eu contei-lhe o que tinha ocorrido. Depois de contar estes acontecimentos, os meus pais, principalmente o pai, em vez de ficarem com uma cara de preocupados, ficaram com uma cara de indignados.
- Foste atropelado por um "Rolls - Royce" no meio da rua e ficaste amigo da pessoa que ia lá dentro!? - disse o meu pai continuando a conversa.
- Toda a gente aqui da aldeia sabe quem é a única pessoa que anda sempre com um "Rolls - Royce". A filha da "Família Bellamy".
O meu pai explicou-me quem era a "Família Bellamy" e proibiu-me de brincar com a filha da família. Mas eu, sem eles darem conta, desobedecia a essas regras.
Todos os dias depois de cortar as árvores eu dizia sempre que ia para a aldeia comprar pão, mas na realidade ia para casa da Mariana. Chegado a casa, nós brincávamos, compartilhávamos a verdade... Bem, éramos verdadeiros amigos!
O que eu não sabia é que a Mariana tinha um namorado e que ela também o tinha convidado no dia, quando eu estava em casa dela. Depois de estar com Mariana, para me despedir, dei-lhe um grande beijo na face e ela retribuíu-me da mesma forma. Só que, infelizmente, o namorado viu tudo e indignado, foi-se embora.
- Jorge não te vás, não é nada disso que estás a pensar - disse a Mariana com uma cara muito triste.
No dia seguinte, soube que Mariana tinha acabado com Jorge e por isso fui falar com ele. Quando o encontrei, ele tentou fugir de mim mas eu agarrei-o no braço e disse-lhe:
- Eu e a Mariana, só somos amigos, mais nada! Eu dei-lhe um beijo na face coma prova da minha amizade. Se eu lhe tivesse dado um beijo nos lábios, talvez fosse pior, mas não, isso não aconteceu. Agora vai falar com a Mariana porque ela precisa de ti!
Jorge ficou impressionado com as minha palavras porque, para ele, eu era um menino, com pequeno porte, moreno, de olhos castanhos e não era capaz de pronunciar aquelas palavras.
Poucos meses depois, estava tudo normal mas fiquei a saber de uma triste notícia. Mariana iria partir para os E.U.A. Eu fiz de tudo para me conseguir despedir dela e consegui no último minuto.
- Mariana! Já sei que te vais embora! - disse eu tristemente.
- João, vou viver com o Jorge para os E.U.A. João, eu nunca mais vou esquecer a nossa amizade e o que fizeste por mim, estava a referir-se à minha conversa com o Jorge.
- Nem eu Mariana, nem eu! - disse eu com a cara cheia de lágrimas.
Parece que hoje, que estou aqui ao pé da mansão da Mariana, hoje abandonada, vejo o "Rolls - Royce" a partir e ela a dizer-me adeus pela janela. Eu nunca mais vou esquecer aquela grande amizade. De certeza que podia desfrutar mais dela, e por isso esta amizade, foi uma amizade inacabada, mas uma amizade inesquecível.

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